É possível prevenir e como fazer o manejo efetivo dos enfezamentos do milho?
Charles Oliveira, que é Engenheiro Agrônomo por Lavras (1993), mestre e doutor em Entomologia pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é pesquisador da Embrapa Cerrados (Planaltina/DF) fala sobre essa doença que vem prejudicando muitas áreas do Brasil.
Ações preventivas para o manejo dos enfezamentos
Há dois tipos de enfezamento, um que a coloração puxa mais para o pálido e outro para o vermelho, provocados pelas bactérias Spiroplasma e Fitoplasma. Essas não passam de uma planta para outra sozinhas, elas precisam de um inseto vetor, a cigarrinha do milho. Infelizmente, não existe uma medida curativa para elas, o que podemos fazer em relação é um conjunto de ações preventivas para o manejo dos enfezamentos da cigarrinha.
Para adotar essas medidas é preciso de um bom planejamento, que pode ser dividido em 4 fases:
- O que fazer na entressafra;
- O que fazer na fase de semeadura e inicial da cultura;
- O que fazer na colheita;
- E quais medidas adotar no pós-colheita.
Na fase de entressafra, antes do plantio, deve-se eliminar as plantas tigueras de milho. O milho é o único hospedeiro da cigarrinha no Brasil então, é nele que ela se abriga, alimenta e multiplica. O grande problema das plantas tigueras na entressafra é que elas são multiplicadoras da cigarrinha e dos patógenos.
Deve-se tentar diminuir a população de cigarrinha na entressafra para quando fizer o plantio a população esteja baixa. Com o milho tiguera no campo essa cigarrinha e os patógenos se multiplicam.
Passado a entressafra, se deve fazer o manejo das plantas de tiguera e pensar na semeadura. Importante, nunca se deve plantar o milho próximo a plantios mais velho, onde existem plantas com sintomas. A cigarrinha gosta de plantas jovens, sendo assim, ela poderá migrar do plantio mais velho carregando os patógenos e colonizar o plantio mais jovem e assim, transmitir a doença em altas populações.
Outro fato importante é a sincronização ou estreitamento da janela de plantio. O grande problema dos enfezamentos é o escalonamento. Se todos os milhos forem plantados aproximadamente na mesma época, teremos plantas mais ou menos da mesma idade, o que fará com que a cigarrinha se dilua nessas plantas. Uma janela estreita de plantio significa plantas de milho por menos tempo no campo, ou seja, uma entressafra maior que é o que queremos.
A escolha do híbrido é fundamental. Hoje no mercado temos materiais mais resistentes e suscetíveis. Devemos escolher os mais resistentes, porém é importante deixar claro para o produtor que devemos rotacionar e diversificar esses híbridos. Se todos os produtores e todas as safras plantarem o mesmo híbrido resistente, os patógenos vão quebrar essa resistência.
Fase inicial da cultura
Os enfezamentos são doenças de ciclo longo, o patógeno ou os patógenos precisam de muitos meses para se multiplicarem na planta para causar os problemas, sendo assim, quanto mais cedo a planta é infectada, pior o problema.
O que devemos fazer?
É uma fase crítica entre a emergência e a fase V8, mas deve-se atentar e controlar a cigarrinha na fase inicial, seguindo os passos:
- Usar inseticida na semente (TSI)
- Fazer pulverizações para controlar o inseto vetor
- Usar apenas os produtos registrados no Ministério da Agricultura, sempre respeitando as informações da bula, feita pelo fabricante e mantendo o intervalo de aplicação
- Realizar a rotação dos princípios ativos desses inseticidas, pensando justamente em não desenvolver uma população de cigarrinha resistentes, pois, se usar somente o mesmo inseticida as cigarrinhas não serão controladas por esse produto.
Por que devemos nos preocupar com a parte da colheita?
A colheita deve ser bem feita. Os grãos e espigas não podem ter contato com o chão ou até mesmo ficarem fileiras remanescentes, pois, esses materiais terão proximidade com a umidade do solo e darão origem às plantas tigueras na próxima entressafra, sendo esse um controle preventivo. Da mesma forma, o transporte com grãos deve ser feito em caminhões próprios.
Pós- colheita
Deve-se fazer a rotação das culturas, evitando o plantio de milho sobre milho ou de outra gramínea. O grande problema dos enfezamentos são os escalonamentos, pois, as cigarrinhas migram levando o patógeno das plantas mais velhas para as plantas jovens.
Pesquisas apontam que as cigarrinhas além do milho, conseguem se alimentar e abrigar em outras gramíneas como braquiária, colonial, aveia, trigo, sorgo e milheto. É aconselhável evitar o plantio dessas espécies e o planejamento do manejo deve ser seguido durante o ano todo.
Quais as perspectivas para a cigarrinha e o enfezamento no nosso país para os próximos anos?
Os enfezamentos existem no país há muitos anos desde a década de 1970. Tivemos vários surtos de enfezamento e eram surtos de uma safra, eu atribuo isso a alguma condição especial climática naquela época. O problema que estamos vivenciando de 2014/15 para cá, é mais complexo. A conclusão que se chega para o problema do enfezamento da cigarra no país hoje, infelizmente é devido ao sistema de produção de milho no Brasil.
Hoje temos a primeira safra, segunda safra, terceira safra, milho grão, milho semente, milho silagem, milho no fundo de chácaras e tiguera espalhada pelo país inteiro. Não existe uma entressafra grande como era antigamente, o modulador das populações da cigarrinha.
A cigarrinha se multiplicava no milho, havia uma entressafra grande, ela não encontrava milho ou tiguera e as populações quase sumiam no próximo plantio. Depois da entressafra as populações da cigarrinha chegavam pequenas, hoje não, o cenário é diferente, ela está encontrando milho o ano inteiro.
A minha visão particular no curto prazo o problema deve persistir. Mas no médio a longo prazo se adotarmos essas medidas de controle, boas práticas agrícolas e com os avanços que estão começando a aparecer na área de pesquisa, como controle biológico utilizando fungos com desenvolvimentos de materiais mais resistente, mais tolerantes por parte das empresas, vamos conseguir conviver com o problema.
Santa Dica
O Santa Dica, podcast de perguntas e respostas da Santa Helena Sementes, convida especialistas experientes do agro para responder dúvidas abordando os temas mais relevantes e debatidos do setor agropecuário, especialmente relacionados às culturas de milho e sorgo.