Sucessão Familiar T.3 Ep.20

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Sucessão familiar precisa ser debatida nos negócios rurais, permitindo que o legado construído por anos seja passado para as próximas gerações. 

Porém, para obter bons resultados nesse processo a sucessão tem que ocorrer de maneira organizada e profissional. Para esclarecer melhor sobre esse assunto, convidamos Hugo Monteiro da Cunha que é especialista no tema! 
 
Hugo Monteiro da Cunha Cardoso é também contador, consultor tributário e de empresas familiares no Agro, professor de direito/planejamento tributário e gestão rural e autor do livro “Guia da Gestão Rural” pela editora Atlas. 

Tenho uma propriedade rural e quero deixar para meus filhos, como começo esse processo de sucessão? 

Cada família deve ter o seu próprio modelo, então é algo bem particular. Mas eu costumo dizer que o mais importante é prepararmos a empresa para o processo de sucessão.  

Existem essas 2 formas de pensar: como que eu preparo a empresa para aqueles que vão vir e como que eu preparo ou escolho o sucessor? 

As grandes dúvidas do produtor geralmente são ‘’Será que o meu filho vai querer tocar esse negócio? Será que vai ter aptidão? E se ninguém quiser tocar, como é que vai ficar esse negócio que eu construí?” 

Ninguém quer que o negócio se acabe, especialmente o fundador da empresa rural deseja que ela dure o maior tempo possível e fique na própria família. 

Na minha opinião, é mais importante preparar a empresa do que preparar o próprio sucessor. Se a minha empresa está organizada na minha partida fica muito mais fácil de qualquer filho dar prosseguimento a ela. 

Se o produtor se prepara, a sua preocupação se torna apenas escolher qual filho vai preparar e treinar.  

Tem muitos casos, infelizmente, que é escolhido um sucessor e ele vem a faltar até antes do pai, ou mesmo ele pode assumir aquela empresa e também rapidamente vir a faltar. Também tem casos em que onde quem menos esperamos como sucessor leva o legado para a frente. 

Portanto, preparando a empresa, criando regras enquanto ainda estão vivos para a manutenção do legado, escrevendo o que é o negócio e deixando formalizado, profissionaliza a empresa e constrói-se algo que os filhos vão entrar naturalmente. 

E como podemos formalizar e profissionalizar uma empresa rural? 

Tem coisas bem simples que o produtor pode fazer, como contratar um software de gestão para que os números não fiquem apenas na cabeça, afinal quanto mais registros mais fáceis para os filhos herdarem. 

O que fazer com o imposto de renda? Deixe tudo organizado, todos os bens e patrimônios, não é só construir uma holding. 

Como estão as matrículas declaradas? O imposto de renda vai servir como base também para esses herdeiros se prepararem e se colocarem a par do que é aquele negócio. 

Primeiro eu arrumo a casa, depois crio as regras. Por exemplo, qual vai ser a remuneração para cada um que participa dentro dessa empresa? 

Por mais que hoje sejam pouco os membros da família, futuramente entrarão mais gerações e com a profissionalização o negócio fala por si. 

Isso é importante para que lá na frente não tenha um tio barrando o sobrinho de entrar no negócio, por exemplo, mas sim a empresa e as regras da empresa dizendo que um filho, sobrinho ou neto pode entrar ou se precisa ter alguma formação ou não. 

Ou seja, são regras que devem ser construídas e tendo a empresa formalizada e o produtor se vendo de fato como um empresário, a chance de êxito no processo de sucessão é muito maior. 

Quando falamos de preparação do sucessor podemos pensar em algo bem simples que é os filhos sendo preparados desde cedo inseridos no ambiente, ou seja, presentes na fazenda, porque assim vão ter os pais como exemplo. 

Irão entender o amor que os pais têm por aquele negócio, vivenciar bons exemplos, brincar na fazenda durante a infância e absorver tudo o que tem de bom dentro desse negócio familiar. 

Assim, fica mais fácil esse sucessor querer estar à frente e chega muito mais inteirado no negócio. 

Para a profissionalização, temos que pensar em algumas regras de governança muito simplificadas para a realidade do produtor rural, que é simplesmente ter os momentos certos para comunicar os membros da família sobre o que está acontecendo na atividade. 

Importante ressaltar que o óbvio para a gente não é óbvio para todo mundo. Então, é importante conversar com os membros da família para não absorverem problemas comentados no dia a dia e sentir que o negócio não é para eles. 

É necessário preparar os momentos certos para falar sobre o negócio e escolher as pessoas certas, saber quem são os membros da família que estarão a frente e precisam de informações, assim é criado um ambiente mais profissional. 

Portanto, o primeiro passo é formalizar a empresa, arrumando a casa e deixando organizado para as próximas gerações, afinal é muito mais fácil herdar um negócio estruturado e conseguir tocar para as próximas gerações do que ter um sucessor bem-preparado herdando um negócio não organizado. 

Assim, mesmo preparado ele pode ter problemas pelo caminho e o risco desta empresa não chegar nas próximas gerações também são aumentadas. 

Quais são os principais desafios para a sucessão familiar no campo? 

Longevidade 

O grande desafio é a longevidade da empresa, porque 90% das empresas no Brasil são familiares e dessas no máximo 5% conseguem chegar na terceira geração, porque passar um negócio dos pais para os filhos é relativamente mais fácil, então, 60% ainda conseguem passar esse negócio e manter no nome dos filhos. 

Agora, quando começa a entrar sobrinhos, primos e esse negócio começa a ter várias famílias diferentes, começa a entrar pessoas de diferentes valores e temos um ambiente mais suscetível a uma separação, ou seja, cada um querer pegar a sua parte e tocar o seu próprio negócio.  

Por que isso é um problema? Porque se perde escala e o custo é maior para se adquirir insumos, perde-se poder de barganha, além de não ter como dividir um maquinário que todos usavam juntos, portanto, são pontos que aumentam os custos. 

A longevidade é um grande desafio. Temos que pensar ‘’Como passar da terceira geração?” porque esta é uma barreira que vemos hoje nas empresas familiares em geral. 

Os próximos desafios são aqueles inseridos dentro desse problema da longevidade. O primeiro deles é o produtor se ver como uma empresa de fato. 

Profissionalização 

Para pensar de uma forma mais profissional, o produtor precisa ter bem separado os âmbitos que estão na teoria na empresa familiar: a família, o patrimônio e o negócio.  

Quanto mais separados estiverem esses âmbitos mais profissional será a empresa, porque assim a empresa começa a ter vida própria e não se confunde mais o que é o dinheiro da família com o que é o dinheiro da fazenda. 

Cada um tem as suas remunerações por atividade exercida dentro do negócio. O sócio recebe por ser sócio, um membro que está dentro do negócio, sucessor do negócio, gestor ou quem trabalha, recebe salário por isso, podem existir remunerações variáveis por metas, etc. Tudo isso tem que ser estipulado. 

E aquele membro que está só na família? Não vai ser negligenciado nem deixar sem receber nenhum valor para conseguir construir o seu patrimônio.  

Ele vai receber uma mesada, os pais poderão pagar a faculdade e formar aquele filho da mesma forma, mas o dinheiro vai vir das remunerações que os pais receberam por serem donos do negócio, do patrimônio e também por trabalharem no negócio.  

Isso é muito importante para garantir um ambiente mais profissional e ter aquelas regras bem claras.  

Outras perguntas a serem respondidas pelas regras são: quem vai entrar nesse negócio? Os filhos precisam ter alguma formação para entrar? Precisam trabalhar fora antes para adquirir experiência? Como que vai ser usado os bens do negócio? Quem pode usar a sede? Todas essas pequenas coisas que podem causar conflito precisam ser regradas para ter um ambiente mais profissional

Diferença entre gerações 

Outro grande desafio é perceber as diferenças entre as gerações. Cada vez mais temos diferentes gerações trabalhando junto, afinal com os avanços da medicina as pessoas estão vivendo mais e, com isso, temos mais gerações no trabalho. 

Hoje em dia, a cada 15 anos surge uma geração totalmente diferente da anterior, por isso se pode ter perfeitamente 5 gerações trabalhando juntas no mesmo negócio e cada uma terá uma forma de ver a vida e querer implementar técnicas diferentes, o que pode gerar conflitos. 

Também temos que perceber que nenhum filho será igual ao pai. Ele vai ser diferente em algumas coisas e até melhor, porque terá novos conhecimentos para colocar em prática. 

É necessário deixar com que as novas gerações estejam em um ambiente que consigam testar as suas inovações. Precisamos compreender que eles são diferentes e achar os pontos comuns para seguir no propósito da empresa respeitando as diferenças entre cada geração. 

É importante pensar sempre que a empresa tem que chegar em um caminho, não importa a forma como vai chegar, esse é um grande desafio.  

É difícil compreender as gerações diferentes, as vezes queremos que o filho faça como nós faríamos, mas provavelmente se for feito tudo como antes o negócio também tem uma chance menor de ter longevidade e de seguir para as próximas gerações. 

Cargos dentro da empresa 

Outro grande desafio é o papel de cada um dentro da empresa. Não é porque a pessoa faz parte dessa empresa familiar que vai ter certo cargo ou papel dentro da empresa. Nem todos os herdeiros vão entrar nessa empresa, alguns vão estar trabalhando dentro do negócio e outros vão herdar a sua parte e ter suas próprias profissões. 

Isso também é muito difícil de definir, o que cada um vai fazer dentro da empresa familiar e principalmente se mais de uma pessoa quiser suceder esse negócio. 

Além disso, é possível ter mais de um sucessor desde que esses papéis estejam claros e formalizadas quais são as tarefas de cada um para não se sobrepor. 

Quando falamos em desafios precisamos achar mecanismos que minimizem a chance de qualquer conflito que possa acontecer entre essas novas gerações. 

Pensando naquele macro desafio comentado no início, é sempre importante buscar mecanismos para atingir a longevidade da empresa e que esses herdeiros sigam trabalhando juntos, porque cada vez que eles forem se separando e criando novos e menores negócios perde-se escala e também a chance desse negócio sair do grupo familiar. 

Portanto, os principais desafios são a longevidade, as diferenças entre as gerações, a profissionalização e os cargos dos familiares dentro da empresa, além de, é claro, o livre acesso ao caixa único. 

Esses são os grandes desafios e quando conseguimos mecanismos que resolvam essas situações, as empresas têm uma chance muito maior de ter um processo sucessório com êxito. 

Pequenos produtores também podem fazer um processo de sucessão? Muda alguma coisa nesses casos? 

 
Tanto pequenos produtores quanto os grandes precisam de preparação para o processo sucessório, porque não é um processo natural nem uma simples passagem de bastão que basta para escolher um sucessor. 

Então, se houver preparação e utilização dos mecanismos a chance de ter longevidade. São coisas simples e adaptáveis a cada negócio. 

A inovação é uma nova ideia que possa ser implantada na prática dentro de uma realidade específica, portanto não adianta pensarmos em coisas que são muito fora da realidade do negócio porque ficarão impraticáveis. 

Sendo um pequeno ou grande produtor, é necessário investir na profissionalização e em ter o que deixar para as próximas gerações independentemente do tamanho. 

Então, é importante registrar os processos e não deixar apenas nas cabeça, porque na falta do responsável o negócio pode acabar.  

Respondendo objetivamente a pergunta: não tem tamanho, todo mundo precisa se preocupar e se preparar com a sucessão. Cada família terá o seu próprio modelo de preparar e por isso tem que pensar numa forma que se encaixe dentro da família, mas é necessário ter. 

Não basta achar que quando não estiver mais aqui, alguém vai ter que assumir esse negócio e decidir na hora o que fazer, porque isso não dá certo. Precisa pelo menos dar um norte para os filhos.  

Cada um vai ter a suas vontades, mas tem que entender também que trabalhando juntos dentro da empresa tem muito mais a ganhar do que se cada um vender a sua parte e fazer o que bem entender, por isso manter os filhos juntos é fundamental para a manutenção da empresa e do legado. 

Ninguém quer construir uma empresa, colocar todo aquele esforço do amor, os valores, o tempo investido para deixar de existir quando o responsável não estivar mais.  

Por isso que é importante pensar neste tema de sucessão familiar independentemente do tamanho. 

Nesse tema de sucessão familiar ouvimos bastante falar sobre holding. Mas, afinal, o que é holding familiar? 

A holding familiar é um instrumento muito útil para sucessão familiar, porque é um mecanismo que separa o patrimônio do negócio da família e fundamental para ter um ambiente profissional. 

Então, quando se cria essa holding, que nada mais é do que uma empresa que vai controlar os imóveis da família, ou seja, o patrimônio da família vai ser passado por essa empresa e não vai mais pertencer as pessoas físicas. 

Vai pertencer a essa empresa que vai ter toda uma regra específica para manutenção dos negócios. E por que que ela é útil para a sucessão? 

Porque organiza o patrimônio, então aquela das dicas citadas anteriormente sobre primeiro arrumar a casa, ou seja, a holding deixa o patrimônio organizado e os herdeiros não vão brigar para saber com que cada um vai ficar. 

Cada um vai ficar com um percentual dentro do todo, todos os imóveis estarão dentro da empresa e cada um vai herdar um percentual, portanto a separação não será feita baseada em uma área que tem o silo, área que tem mais água, que tem a sede e assim por diante, ou seja, todas essas brigas que costumamos ver em processos sucessórios são acabadas com a holding.  

Também podemos para criar regras de como um sócio será pago ao sair da holding, quem poderá entrar nessa holding, se tem que ser da família ou se pode entrar qualquer pessoa, ao vender se a família terá direito de preferência antes de oferecer para uma para um terceiro, entre outros. 

Portanto, é uma empresa que protege o patrimônio dentro da família. Também pode-se fazer a doação desse patrimônio em vida e proteger os pais na cláusula de administração para que toda decisão que envolva o patrimônio e a venda passe a precisar da assinatura dos pais, até quando não estiverem mais aqui. 

Esses são os principais benefícios, a organização, a proteção do patrimônio dentro da família e proteção dos fundadores do negócio rural. 

Além disso, a holding familiar também pode trazer economia tributária na operação da atividade rural. Esse instrumento se popularizou visando uma economia tributária na transferência do patrimônio, seja na sucessão desse patrimônio em vida. 

Hoje em dia, existe uma evolução dos órgãos estaduais e não é mais tão benéfico assim e não dá tanta diferença tributária passar o patrimônio dentro da holding, mas os benefícios que são os extrafiscais, que é esse que organiza o patrimônio e prepara para a sucessão de fato, ainda são fundamentais dentro de um processo sucessório. 

Importante ressaltar que uma holding não cabe em todo produtor, e não é pelo tamanho. Temos que simular e ver dentro da realidade de cada negócio se vai valer a pena criar uma holding, porque por mais que ela tenha muitos pontos positivos também aumenta um pouco a complexidade. 

Como, por exemplo, talvez aumentar um pouco o custo com o contador, os sócios administradores da empresa vão ter que ter um pró-labore, INSS, então também tem que analisar se vai valer a pena no todo. 

Portanto, uma holding é uma ótima ferramenta, mas não cabe para todo mundo. Tem que avaliar vários pontos e colocar os números no papel do próprio negócio para ver se esse instrumento vai se encaixar dentro do formato da empresa. 

Mas é um grande instrumento e, para quem ainda tem pouca informação, sugiro que busque informações sobre a holding familiar, porque é muito interessante e relevante quando falamos da profissionalização das empresas rurais. 
 

Para quem quiser acompanhar o Hugo Monteiro nas redes sociais o Instagram é @hugomonteirodacunha e LinkedIn é Hugo Monteiro da Cunha. 

No instagram vocês poderão encontrar um link na biografia de um e-book gratuito sobre holding familiar ou clicando aqui e para quem quiser se aprofundar mais é indicada a leitura do Guia de Gestão Rural (Editora Atlas).  

Hugo está à disposição para tirar suas dúvidas em suas redes sociais relacionadas a esse tema tão importante que é a sucessão familiar e também a profissionalização dessas empresas rurais para ter o que passar e deixar um legado adiante.  

Santa Dica

O Santa Dica, podcast de perguntas e respostas da Santa Helena Sementes, convida especialistas experientes do agro para responder dúvidas abordando os temas mais relevantes e debatidos do setor agropecuário, especialmente relacionados às culturas de milho e sorgo. 

Veja também os episódios do Santa Dica sobre Gestão Financeira na Fazenda e Agricultura de precisão 

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